quinta-feira, novembro 16, 2006

Manifesto

Quando vi o preço dos ingressos para o show do New Order no Rio (R$115 para estudantes) tinha decidido tomar partido contra a safadeza e simplesmente não ir. O dólar já não vale tanto quanto costumava, mas, embora a quantidade de bandas vindo ao Brasil tenha aumentado consideravelmente, os produtores cobram preços cada vez mais altos. Em minha memória afetiva, esse processo começou no show que o Green Day fez no Rio, em 1998. À época, os ingressos de shows internacionais não passavam de R$25 (assim como uma promoção no McDonalds custava menos que R$5), mas para o Green Day o preço subira para R$40. Decidi seguir minha crença política e simplesmente não ir ao show. Ouvi comentários posteriores de que a casa estava vazia, e à porta cambistas tomavam prejuízo vendendo ingressos pelos usuais R$25. Minha atitude política, enfim, ressonara.

Saltamos para o show do RHCP há um par de anos atrás, cujos ingressos custavam R$90 (sem direito a meia-entrada de estudantes). Não dou dois centavos para o RHCP desde meus quinze anos de idade (embora o Bloodsugarsexmagic tenha sido o primeiro cd que comprei, junto com o Facelift do Alice in Chains) e ainda assim esbravejei alfinetes contra a facada indiscriminada dada pela organização. Em Fevereiro, porém, senti o coração pesar no bolso: R$100 a meia-entrada para o U2. Em São Paulo. Com filas de 12 horas para comprar ingresso. Consolei-me dizendo que a enorme produção que o U2 trazia para o Brasil até certo ponto justificava o valor, e acabei suicidando-me duas vezes e vendo a banda duas noites seguidas. Mas só porque era o U2, e Bono seria o primeiro a dizer que o U2 está acima de qualquer política.

Segui militando contra o valor absurdo da entrada para o show do New Order, considerando até tecer um post de protesto para o blog. Lembrei-me dos R$40 que não dei no ingresso do Green Day, e ainda me pergunto se gastei esse dinheiro em alguma coisa mais significativa do que ver uma das minhas bandas favoritas ao vivo. Pensei também em como seria ouvir "Regret" ao vivo, provavelmente minha música favorita do New Order. Minha Clarissa disse que eu devia ir, pois me arrependeria depois. Respondi que era uma questão política mais ampla, e que ir ao show seria apoiar um tipo de postura que acredito ser abusiva. Minha irmã insistiu para que eu fosse, pois ela queria ir mas não tinha companhia. Retruquei que ir em shows sozinho não é necessariamente desagradável e que ela não devia deixar de ir só por conta disso (embora o preço do ingresso fosse motivo mais nobre e definitivamente suficiente). Minha mãe tentou me convencer que gasto R$115 de maneiras bem menos interessantes. Engoli a boa resposta que nunca veio.

Hoje, um dia antes de "Temptation" e "Bizarre love triangle" serem ouvidas ao vivo no Rio pela primeira vez, continuo minha luta contra o preço abusivo dos ingressos para o show. Torço para que a casa fiquei vazia e que a organização sofra as conseqüências que merece (mesmo sabendo que irão culpar a cidade, dizendo que o Rio realmente não tem demanda suficiente para shows internacionais, sem nunca cogitar que, talvez, só talvez, o preço tenha sido alto demais para a nossa realidade, até mesmo comparativamente). Mas quando olho para o par de ingressos que dizem "NEW ORDER", em caixa alta, já saltitando sobre a mesa da sala, lembro da reação de meu caro Develly quando admiti ter cedido: "Então a sua postura política é obedecer às mulheres?". E ainda tem gente que acha que eu deveria escrever canções políticas...

segunda-feira, novembro 06, 2006

Retomando...

1 Ainda sobre videoclipes, está em cartaz no Rio o filme "Pequena Miss Sunshine" (Little Miss Sunshine, 2006), de Jonathan Dayton e Valerie Faris - prova cabal de que o videoclipe é uma linguagem particular, com seus próprios códigos e especificidades. A dupla Dayton e Faris faz sua estréia em longa metragem já com um currículo de respeito de clipes ("Californication", do RHCP, "Say it ain’t so", do Weezer, além de obras-primas ao lado do Smashing Pumpkins, como "Tonight, tonight" e, especialmente, "1979"), e, se essa estréia não chega a ser desastrosa, não traz para o cinema o brilho que eles não raro alcançavam nos vídeos musicais. Apesar do excelente elenco e de um começo visualmente interessante, o filme se torna esquemático justamente no narrar. O talento que a dupla tem em realizar obras de poucos minutos se mostra insuficiente nos 101 do longa, talvez por terem confiado em uma "estilização" que é suficiente para um clipe, mas que acaba por revelar as faltas de um roteiro sem muita criatividade e a inabilidade, por parte dos diretores, para com a linguagem cinematográfica.

2 Em compensação, "Dália negra" (Black Dahlia, 2006), o novo Brian de Palma, é puro cinema. Se nem todos os seus filmes são brilhantes como o que parodio no título desse blog ("O pagamento final", ou, Carlito's way, 1993), "Dália negra" traz De Palma em sua melhor forma, mostrando que ele ainda é um dos realizadores que melhor explora o espaço no cinema (o já antológico plano-sequência na primeira meia-hora de filme é apenas um exemplo mais óbvio de um domínio que se confirma plano a plano). Em semana onde a acidez anti-Hollywood esteve curiosamente presente (além do filme de De Palma, assisti hoje "Um convidado bem trapalhão" – The party, 1968 – de Blake Edwards; e "Beijos e tiros" – Kiss, Kiss, Bang, Bang, 2005 – de Shane Black, coincidentemente, todos críticas à indústria cinematográfica), "Dália negra" firma-se como o melhor filme de um diretor americano que vi nos cinemas em 2006 (lembrando que alguns candidatos em potencial ao meu top10 anual acabaram passando batido na minha programação, falha que pretendo corrigir conforme os filmes forem lançados em DVD).

3 Mais sobre o post dos videoclipes, esqueci de falar mal de uma última coisa: o último clipe do Forgotten Boys - aquele em que quatro garotas substituem os caras da banda em um show - é outra vítima da síndrome da estorinha. Mais uma idéia bacana que vai pelo ralo quando fica com cara de novela ruim.

4 Parada roqueira da semana:
Brian Wilson - Smile
The Lawrence Arms - Oh! Calcutta!
Guided by Voices - Isolation Drills
Elvis Costello - My aim is true
Thin Lizzy - Jailbreak