sexta-feira, março 30, 2007

Sob a música

Bruno Maia - amigo desde a faculdade e atual parceiro no Chappa - escreveu no seu ótimo sobremusica uma reflexão acerca de uma conversa que tivemos há um par de dias. Comentava com o Bruno que apesar do número crescente de veículos na internet que se propõem a falar sobre música, poucos realmente dedicavam atenção à música em si. Sabemos quem está fazendo turnê com quem, quais as cores das novas camisas lançadas por todas as bandas do mundo, ou que roqueiro louco foi parar na cadeia depois de fazer alguma roqueirice mais descontrolada. Mas, tirando a Pitchfork e algumas gotas mais inspiradas do AMG, ninguém estava realmente se debruçando com maior cuidado sobre a música pop na atualidade. Como dizia o professor Fernando Sá sobre o jornalismo político brasileiro nos tempos de faculdade, a cobertura musical se tornou relato de corte. Sabemos com quem o rei almoçou, e quem transita pelo castelo, mas ninguém parece se importar com a natureza do quê está sendo feito.

Qual foi a última vez que você leu uma crítica brasileira que fizesse mais que indicar similares, do tipo “se você gosta de X e Y, vai gostar de Z também”? A crítica de música pop no Brasil orienta nossas compras, mas pouco diz sobre as obras. Canções estão inseridas no mundo, e cada uma delas é transcrição de um olhar sobre o mundo. O que diz esse olhar? Como ele se articula com o que está sendo feito na arte no momento, ou foi feito no passado? Como recebemos essas declarações sobre o mundo? O que normalmente nos é oferecido são resenhas chapa-branca (amor pela democracia ou medo de perder anunciantes?), ou indicações como “banda com letras políticas” (sem nunca ter o cuidado de entender que discurso político é esse) e “uma original mistura de ritmos” (que ritmos? O que quer dizer essa mistura?), em duas ou três linhas de palavras jogadas. Todo mundo sabe que Amy Winehouse é uma garota branca com voz de negona, que ela tem atitude e visual controversos, e que suas letras falam de sexo (nossa!) e drogas (duplo nossa!). Mas quantos textos você leu que discorressem sobre a maravilha que é o disco Back to black?

A impressão que tenho é que, com raras exceções, a crítica de música pop não leva o gênero que se propõe comentar a sério. Se temos hoje a Contracampo e a Cinética fazendo trabalhos interessantes no cinema, são frutos de uma consciência crítica que já existe no Brasil desde Moniz Viana ou Alex Viany. O que as duas revistas perceberam de original é que na internet não existe a limitação de espaço dos boxes de jornais e revistas, e que por isso é meio ideal para análises mais dedicadas. A crítica musical na internet mantém as três linhas das revistas superpopuladas por resenhas, e as impressões cristalizadas nos primeiros 20 segundos da primeira canção. Em mundo onde o tempo de se baixar um disco é quase o mesmo de o necessário para se ler uma resenha, para quem esse tipo de crítica ainda é relevante?

O Bruno fala em época de vacas magras na música brasileira; mas como esperar que fosse diferente? Se o crítico não leva a sério a produção de sua época, a tendência é que o ouvinte tenha uma relação cada vez mais efêmera com ela, e que o Ryan Adams continue lançando 30.000 discos de bobagens por minuto na internet. Balela aquela história de que a crítica é mera atividade parasitária, pois o pensamento crítico ajuda a definir os caminhos da arte. É claro que todos os avanços tecnológicos e as tendências comportamentais são importantes, mas e o centro de tudo isso? Temos interessantes estudos sociológicos sobre o YouTube, olhares cuidadosos sobre os sucessos do MySpace, e dissertações cíclicas sobre o novo samba de classe média na Lapa. Que eles continuem sendo feitos. Mas e a música? Quem fala sobre ela? Quem ainda tenta decifrar um disco com paixão e afinco nos dias de hoje? Quem dedica quatro ou cinco parágrafos de reflexão original sobre o impacto de uma obra? E, ao mesmo tempo, será que precisamos de mais gente nos dizendo que o sucesso do Fresno e do Cansei de Ser Sexy são pedras fundamentais de uma nova era dos meios de comunicação?

Fenômenos como esses têm lá seu interesse, mas são o ruído branco que emudece boas questões. Esse blog não é exatamente sobre música, mas toda vez que me proponho a escrever sobre o assunto, tento faze-lo da forma mais dedicada possível. Tento entender o que existe sob a música; o que faz que uma determinada combinação de barulho e melodia chegue até mim de forma mais intensa do que outra. Tento perceber como elas alteram meu olhar sobre o mundo e me formam enquanto escritor de canções. Tento respeitar o trabalho sério de artistas extraordinários que ainda fazem da música pop uma constante fonte de inspiração na minha vida. Tento escolher as melhores palavras para a batalha perdida de se narrar o brilho nos olhos. É o mínimo que posso oferecer nesse meu mal cuidado quintal. E fico com a impressão que dessa conversa com o Bruno podem sair coisas boas. Resta a torcida de que mais gente entre na discussão. Podem começar aí pelos comentários.

domingo, março 25, 2007

Melhores de 2006 - Discos



01 - Lucero - Rebels, rogues and sworn brothers

Conheci o Lucero pelo segundo álbum, uma quase obra-prima chamada Tennessee¸ lançada em 2002. A curiosa mistura de Uncle Tupelo e Replacements praticada pela banda ganhava um charme mais que especial nas gravações lo-fi à Guided by Voices, na insistente abordagem minimalista dos arranjos, e no impressionante vocal de Ben Nichols, rasgando convenções sulistas com gosto de whisky e beijos roubados. O alt-country de Tennessee afundaria ainda mais na baixa fidelidade no disco seguinte, That much further west, e viraria 180o com a produção mais elaborada (para padrões lucerianos) de Nobody’s darlings. Embora ambos fossem bons discos, o álbum de 2002 ainda guardava a aura de um tesouro perdido, de uma sensibilidade bruta que não desabrochara como imaginado nos passos seguintes da banda. Mesmo Nobody’s darlings tendo apontado um norte musical diferente, era difícil prever a virada dada nesse Rebel, rogues and sworn brothers. Ao alt-country discreto das primeiras gravações, o Lucero foi buscar inspiração em Bruce Springsteen, gerando um paradoxo musical: um disco de rock arena essencialmente minimalista. Novas sementes em solo já maduro, de onde brota não só o melhor álbum já feito pelo quarteto de Memphis, mas também a obra musical mais impressionante de 2006.

Impressionante por nascer de uma contradição de termos: como abordar o rock clássico sem trair o característico minimalismo da banda? Como resposta, o Lucero cria algo completamente novo, rearticulando convenções separadas pelo tempo. Sobrevivem a inabalável timidez da bateria de Roy Berry e o timbre particular (terrível quando isolado, mas homem de família dentro das canções da banda) da guitarra de Brian Venable; mas entram os inestimáveis teclados de Rick Steff (responsável pelas teclas nos discos da Srta. Cat Power), uma boa dose de velocidade, e o vocal de Nichols em sua melhor forma, traduzindo como nunca a urgência das canções da banda. Sim, a pequenez dos arranjos (nunca tocando mais do que o estritamente necessário) do Lucero não trai a urgência de cada peça musical que compõe Rebel, rogues and sworn brothers, e muito disso nasce na interpretação vocal de Nichols. Contradição que transcreve o que existe de mais interessante na cultura norte-americana: a reapropriação, o convívio das mais arraigadas tradições com a ponta extrema da modernidade, a criação de algo novo pela inversão de desgastadas convenções.

Valores muito bem resumidos em “What else would you have me be?”, lamento de um marginal apaixonado que cobre batida tirada dos clássicos de Phil Spector (produtor famoso pela super-produção dos arranjos) com simples Mi-Lá-Si. Contradição tão clara quanto o encontro do produtor com os Ramones, em End of the century: a convivência de extremos do básico e da exuberância. O bruto que se dobra. O bandido que chora por a amada (para quem comprava bebida e cigarro) ter partido: “I gave you everything I stole / And you stole your heart away from me / A pair of thieves and don't you know / That's the way that we will always be / You used to love me / Running wild and sleeping with the thieves / C'mon baby, what else would you have me be?”. “I don’t wanna be the one” busca outros três acordes (que, ao fim do dia, acabam sendo os mesmos) para desenhar um rock sem curvas, em que a bateria não pisa no freio nem mesmo para o solo de hammond, no meio da canção, e um quarto acorde aparece para ajudar no belo riff de guitarra.

É em “San Francisco”, porém, que o Lucero mostra onde de fato chegou. Tão básica quanto qualquer outra canção da banda, ela mistura acordeão a riffs precisos de guitarra, e uma das interpretações vocais mais impressionantes da música recente. “Like unlucky sailors just swept out to sea / I think all the girls I've loved walked through your streets /But the waves and the fog always took 'em from me”, canta Ben Nichols, esgarçando cordas vocais em desespero autêntico como não víamos desde a partida de Kurt Cobain. Todas as bandas de screamo parecem ainda mais patéticas, e toda a porcariada que se convencionou chamar de emo afoga em rasos pires; os homens encarnados por Nichols já passaram há muito da adolescência e já viram de tudo nessa vida, mas ainda assim sofrem como o diabo nas mãos das mulheres. Mas em vez de criarem barreiras de rancor, como alguns famosos maus rapazes do rock, curvam-se como narradores de filmes noir -vistos sempre através de copos cheios e fumaça de cigarro - diante da femme fatale que é o amor.

E bem quando achamos ter presenciado o ápice de uma banda, vem “I can get us out of here” para mostrar que o jogo está muito longe do fim. Guiada por intoxicantes linhas de teclado, a canção é síntese irretocável do inusitado encontro de gêneros promovido pelo Lucero em seu mais recente trabalho. Como em “Depois de horas”, acompanhamos o casal que passa a madrugada perdido no lado errado da cidade (quase enxergamos os olhos azuis da garota que cegam como o sol), e sentimos que a canção que narra o evento poderia bem ser a sua trilha-sonora. E com quatro ou cinco acordes o Lucero nos carrega por uma das melhores canções do ano, berrando “isto sim é o ápice de uma banda”.

Se o ritmo imposto pelas quatro primeiras canções não é mantido pelo resto do disco, Rebels, rogues and sworn brothers traz boas surpresas suficientes em nunca perder a atenção do ouvinte. “1979” baixa a pressão do disco e, mesmo não sendo tão brilhante quanto o hino dos Smashing Pumpkins, tem espaço para versos como “Now don't, don't give up on me not quite yet / Leaving me with only letters that I said I never kept” ou o final “Tell me why, just why / You had to go / Cause I'm, I'm no good / Out here on my own”. “Cass” lembra “A mulher mais linda da cidade”, de Bukowski, e ganha um memorável riff de guitarra. “The mountain” e “Sing me no hymns” se aproximam de The Who, em rockões mais cadenciados e dinâmicos. A extraordinária “She’s just that kind of girl” retoma o pique inicial das primeiras faixas com um belo riff, e parece a irmã pouco menos atraente (mas ainda deslumbrante) de “I can get us out of here”.

E, ao fim do disco, temos as baladas, claro. “On the way back home” e “She wakes when she dreams” fecham o disco à maneira do velho Lucero, melancólico e nostálgico como todo balcão de bar. Na primeira, dois amigos que saíram da cidade natal se reencontram a caminho de casa, e contemplam as curvas que suas vidas tomaram. “To get outta here / Two options one chance / You joined the army / I started a band”, canta Nichols em verso capaz de resumir um país. “She wakes when she dreams” é conduzida por uma linda linha de piano, tocada com uma delicadeza que se choca com a rouquidão do vocal. Mais uma vez o passado define o presente: “Nothing it seems went according to plan / Who are we kidding, there was never a plan / We followed our instincts / In the worst kind of ways”. E agora a garota dorme quando está acordada, e busca refúgio nos sonhos que a levam para a vida que gostaria de ter tido.

Em ano de álbuns imperfeitos, Rebels, rogues and sworn brothers é tão falho quanto qualquer outro. O que faz dele um disco especial é justamente a capacidade de transformar seus defeitos em conceito, em dados definidores de sua própria essência. Não uma essência opressora pela idealização, mas sim a essência humana, que engloba erros, acertos e uma penca de contradições. Mas até mesmo em seus problemas, é um álbum extremamente genuíno. Se algumas bandas inflam seus tropeços com a capacidade de destruir seus valores, o Lucero nunca desrespeita a si mesmo. Disco ousado em suas contradições, Rebels, rogues and sworn brothers é áspero mas doce, grandioso mas mínimo, corajoso mas frágil. É o espírito da América, com seus problemas e encantos, encapsulado em 12 faixas. É um belo disco de rock and roll.

segunda-feira, março 12, 2007

Melhores de 2006 - Discos



02 - The Hold Steady - Boys and Girls in America

Colocar uma descoberta recente entre as melhores coisas de 2006 pode parecer exagero de ouvinte afobado. A não ser que a descoberta em questão seja Boys and Girls in America, mais novo trabalho do quinteto nova-iorquino Hold Steady. O terceiro disco da banda (conheci os outros dois apenas em retrospecto) é a mais urgente peça de música lançada em 2006. Auto-intitulada como a banda de bar número 1 da América, o Hold Steady dilui Bruce Springsteen e Thin Lizzy em uma mistura de destilado com todas as drogas que estiverem ao alcance, e em 11 faixas te leva para uma noite que parece sempre longe de acabar.

Mas por que canções que combinam álcool, drogas, garotas e rapazes ainda fazem tanto sentido? O que diferencia a poesia de pé sujo de Craig Finn, líder do Hold Steady, de toda a bagaceirice chata dos anos 70? Por que um álbum que começa citando Kerouac ainda ressoa no mundo? O enigma por trás de várias dessas perguntas é um dos principais méritos de Boys and Girls in America. E quando tiramos do caminho tudo aquilo que não conseguimos decifrar, sobra uma particularidade essencial: em vez de falar sobre os atos, Finn canta a sinestesia das lembranças.

Para os olhos de Craig Finn, o mundo é bastante semelhante àquele de Wong Kar-wai. Os encontros são fugazes, os reencontros não raro decepcionantes, os significados são posteriores, os diálogos se repetem. A memória é o único registro. A diferença é que os filmes de Kar-wai se preocupam com questões amorosas de policiais, matadores e escritores, enquanto as canções do Hold Steady falam sobre jovens em uma festa interminável. E se o recorte traz riscos inevitáveis (paternalismo, moralismo, generalização), Finn torna toda a situação mais complexa adicionando uma dose cavalar de culpa cristã. Os rapazes e garotas na América se despem da moralidade para encontrar a noite perfeita, mas esbarram em dogmas e costumes da infância que impedem que a experiência seja plena. Tomam toda sorte de drogas para construir momentos inesquecíveis, mas essas mesmas drogas esfumaçam a memória e deturpam o registro. “Most nights were crystal clear but tonite its like it's stuck between stations on the radio”, define a faixa de abertura. A imprecisão da memória é dado essencial em Boys and girls in America. Era ou não era a mesma garota? Houve ou não houve o beijo?

Difícil separar o conteúdo musical do lírico no Hold Steady: o conceito da banda é tão bem delineado que acordes e palavras buscam, sempre, um mesmo efeito. Estão lá os pianos tirados de Born to run, as guitarras oitavadas de Jailbreak, os metais que lembram Rocket From the Crypt e os solos que derretem os rostos dos mais dedicados heróis da air guitar. Mas tudo isso cairia no saudosismo vazio não fossem as estórias. A garota que beija como nenhuma outra, mas não é cristã das mais confiáveis (e que dança melhor que qualquer uma, mas daria uma péssima namorada). O poeta que morre por acreditar que suas palavras eram boas o suficiente para salvar sua vida. A viciada que ganha dinheiro nas corridas de cavalo e gasta tudo comprando drogas pros amigos (personagem que parece saída de “Estranhos no paraíso”, clássico de Jim Jarmusch). A banda que toca “Sabbath bloody sabbath”. A garota que sofre por nunca conseguir ficar tão chapada quanto da primeira vez, e chora ao falar sobre Jesus. Os beijos que fariam Judas parecer sincero. Os lençóis que mancham, e os pecados que saem com água. Personagens e idéias que reaparecem em diferentes canções, como as pessoas que você conhece de vista por irem sempre à mesma festa que você.

Se o universo criado por Finn alcança a rara proeza de fazer um disco parecer interessante no papel, as canções são razão suficiente para colocar (quase) todo o Boys and girls in America na lista dos rocks mais legais de 2006. “Stuck between station” abre o disco de forma mais que apropriada: todos os elementos que serão aprofundados nas canções seguintes já aparecem nos primeiros 30 segundos. Os riffs pontudos de guitarra, as belas linhas de teclado e órgão, o vocal quase falado de Craig Finn; o jogo fica claro de início, e a fruição do álbum está voluntariamente vinculada a essa primeira impressão. “Chips Ahoy” é séria candidata a melhor faixa do disco, com seu memorável duelo de guitarra e hammond e o vocal de galerão no refrão. A compassada “Hot soft light” tem um dos melhores refrões do disco. “Same kooks” é, sozinha, justificativa para a invenção da guitarra.

E, como toda banda de rock clássico digna de um vintém, o Hold Steady também compõe baladas. “First night” é a que melhor desempenha o papel, embora os violões de “Citrus” e os pianos de “Party pit” rendam preciosos respiros ao longo do disco. “Massive nights” é fanfarronice em forma de música, e a incrível “Southtown girls” é pronta candidata a uma das melhores canções para se cantar bêbado já feitas na história (lembrando que “Living on a prayer” tem título intransferível nessa categoria). E embora a banda promova o cruzamento de gêneros e instrumentos pouco prováveis, Boys and girls in America se sustenta com inabalável unidade.

A preocupante exceção é “Chilout tent”, penúltima faixa do álbum. Tentativa mais rebuscada de contar uma estória, a canção traz Finn como narrador, enquanto Dave Pirner (ex-Soul Asylum) e Elizabeth Elmore (Sarge/The Reputation) fazem as vozes dos personagens principais. O aprofundamento teatral na estória de dois jovens que se conhecem tomando intra-venoso no posto médico de um show acaba revelando uma canção mal acabada, provando que muito do que impressiona nas letras de Craig Finn está mais intimamente ligado à música tocada pela banda do que percebemos. A voz de Elizabeth Elmore está em registro tão desconfortável que estraga um bom refrão, quebrando a diegese proposta pela própria canção. Todas essas deficiências fazem de “Chilout tent” uma exceção em um álbum quase perfeito. Essa exceção só se torna preocupante quando percebemos que a canção expõe algumas das fraquezas do universo lírico que, até então, nos conduzira de forma tão impressionante. Os personagens ganham caracterizações tão extremas que se aproximam de caricaturas, e as sedutoras imagens de Finn parecem ressoar em um acomodado vazio.

Não fosse a possibilidade de esgotamento prematuro de um projeto estético em formação, Boys and Girls in America estaria no topo da minha lista esse ano. Raramente encontramos discos tão abertamente apaixonados pelo rock’n’roll quanto esse, e estar diante de obra que transpira honestidade só faz desmontar as aparências que macularam um mundo que, um dia, nascera para ser espontâneo.

domingo, março 11, 2007

Chappa

A razão para minha falta de periodicidade recente aqui no blog é que estou, também, escrevendo para o recém-criado site Chappa. Enquanto esse blog continua sendo lar de todas as minhas inflamações de ego, o Chappa é uma boa fonte para quem se interessa por todo o lado industrial/tecnológico/econômico da música. Além do site, o grupo Chappa estará promovendo, nas próximas quatro quartas-feiras, o Música Chappa Quente - uma série de debates sobre música em quatro faculdades cariocas. A lista dos convidados confirmados para cada uma das mesas está disponível no site, e o flyerabaixo traz todas as datas e locais. O evento é gratuito e aberto ao público. Não hesitem em repassar.




sexta-feira, março 09, 2007

Melhores de 2006 - Discos



03 - Johnny Cash - American V: A Hundred Highways

“It should be a while before I see doctor Death”, canta Johnny Cash em “Like the 309”, a única canção propriamente inédita de American V: A Hundred Highways.
Somos tomados pela sensação de que, talvez, a primeira linha da última canção escrita por Cash não seja mais que uma tentativa de auto-convencimento, e imaginar sua imponência curvada diante do inevitável é de desmontar homens feitos. Pouco tempo depois, Johnny Cash foi tirar suas contas com o tal doutor, e esse A Hundred Highways ganha inevitáveis feições de testamento. A obra derradeira do iluminado encontro de dois homens-música (Johnny Cash e Rick Rubin) é um auto-retrato, uma biografia em canções.

Muito do brilho da série American Recordings é mérito de Rick Rubin. A idéia do produtor de trazer Cash para o presente, buscando cruzamentos possíveis de suas premissas estéticas com a música pop contemporânea, é o que faz com que os cinco discos sejam pontos altos em uma obra tão vasta e importante. Embora nem todos os passos tenham sido firmes, a American Recordings se afirma, com esse último volume, como uma das mais impressionantes criações da música recente. A produção de Rubin – aqui concluída após o falecimento de Johnny Cash – não trai a adequada discrição dos volumes anteriores, e adorna uma das mais icônicas vozes da música mundial com arranjos simples e de finíssimo gosto.

Mas como falar de música quando estamos ouvindo o balanço de vida de um artista? O que é a música diante da existência? Para que servem canções quando a morte não mais se confunde com a linha do horizonte? Em A Hundred Highways, o artista parece nos dizer que vida e música são uma coisa só. E se o disco é tomado de uma serenidade por vezes desconcertante (sensação próxima à transmitida pelos últimos filmes de Akira Kurosawa), a voz de Cash parece ter amado cantar a vida. Se ele abre o disco pedindo ajuda a Deus em seus últimos passos, é porque Cash quer nos levar em uma última caminhada pelos entroncamentos da memória. A humildade perante os mistérios da vida - nervo central de sua estética - requer esse humilde pedido diante dessa inquietação maior. Atendido o pedido, Johnny Cash canta para nos mostrar, em cada faixa, a beleza desses mistérios.

“If you could read my mind” canta a distância inevitável entre duas pessoas que se amam, e a combinação entre a interpretação do cantor e o humor original da letra culmina em fascinante ambigüidade. “The feeling’s gone and I just can’t get it back”, lamenta Cash, ao final da canção. Mas a caminhada continua, como diz “Further on up the road” – bela interpretação de Cash para a canção de Bruce Springsteen. “On the evening train” traz a dor para o primeiro plano: “The babies eyes are red from weeping / His little heart is filled with pain / ‘Oh daddy,’ he cried, ‘they're takin' momma / Away from us on the evening train’ ", diz o narrador, enquanto um caixão é colocado dentro do trem. Moldada pelo timbre de Cash, a dor da criança pela percepção da morte se torna evidência da vida.

“Love’s been good to me” começa humilde, mas escala diminutos para terminar como uma das mais impressionantes canções do disco. O amor que partiu em “If you could read my mind” é revisitado, aqui, sem nenhum traço de arrependimento: “There was a girl in Denver / Before the summer storm / Oh, her eyes were tender / Oh, her arms were warm /And she could smile away the thunder / Kiss away the rain / Even though she's gone away / You won't hear me complain”. Ao fim da vida, a memória perde qualquer rastro de amargor, e se torna agradecimento pelo que foi vivido. E, aos poucos, Johnny Cash nos conduz por todos os mistérios que sempre o encantaram: amor, Deus, vida, música, morte, consciência.

O quinto volume da American Recordings é um registro último dessa visão de mundo, que se torna ainda mais fascinante por chegar íntegra ao final. A interpretação de Cash demonstra o refinamento conquistado com os anos, e a consistência de seu projeto artístico domina cada uma das 12 faixas do álbum. Seu testamento não poderia contradizer mais o discurso de “Johnny & June” (ou, se preferir, Walk the line), filme de James Mangold sobre a vida do cantor. Enquanto Mangold constrói um homem partido que alcança a redenção, Johnny Cash retruca que a vida partida é a redenção em si. Se as linhas onde ele caminhou foram tortas, foram as linhas que ele escolheu para escrever sua história. Os eventos, em si, pouco significam. O que sobrevive é a intensidade com que eles foram vividos, a pulsação que conduzia a caneta nos traços dessa biografia.

quarta-feira, março 07, 2007

Melhores de 2006 - Discos



04 - Belle & Sebastian - The life pursuit

Dia desses ouvi uma estória sobre o Miles Davis. Reza a tal estória que ele ficava incomodado por as pessoas ficarem conversando durante suas apresentações, até que decidiu se afastar um pouco do microfone. Miles Davis reparou que, tocando mais baixo, as pessoas tinham que fazer silêncio para ouvi-lo, e por conta disso ele criou um novo estilo, uma nova maneira de tocar. É mais ou menos assim que eu me sinto em relação ao Belle & Sebastian. A delicadeza que a banda usa para esculpir cada acorde é tão bem calculada que você tem que parar de fazer qualquer coisa para ouvir seus discos. Tudo parece tão belo e frágil que um movimento mais brusco teria o poder de quebrar o tempo das canções. Então você senta e fica ali, quieto, ouvindo o que a banda tem pra te dizer.

Essa delicadeza é o que o Belle & Sebastian sempre teve de mais original. Foi isso que impressionou quando o grupo tomou o mundo pelo pé do ouvido, com o belo The boy with the arab strap – disco que, na verdade, resume o trabalho que a banda já fazia nos álbuns e singles anteriores. Em época de gravações ultracomprimidas, os sussurros da banda se destacaram entre os gritos, e o mundo parou para ouvir. Esse estilo tão bem delineado parecia, porém, atingir o paroxismo no disco seguinte. Fold your hands child, you walk like a peasant mantinha todos os elementos que faziam do B&S uma banda especial. Apesar disso, a fragilidade das canções logo assumia a forma de fraqueza, e a impressão inevitável era a de que a estética da banda se tornava decrescente. Tudo estava no mesmo lugar, mas esse lugar não parecia mais tão agradável. O disco te mandava sentar para escutar, mas você logo ficava com calor e tinha vontade de ir fazer outra coisa.

O fim do B&S como conhecíamos estava decretado pelas próprias canções. Até que saiu o disco seguinte, Dear catastrophe waitress, e a trupe de Stuart Murdoch se mostrava tão ciente das limitações de seu velho projeto estético quanto qualquer pessoa com orelhas. Chamar o disco de ruptura seria banalizar o termo, mas canções como a magnífica “If she wants me” e “You don’t send me” traziam um inesperado novo fôlego à banda. Não era a constatação de que o paroxismo não passava de aparência, mas sim sutis mudanças que indicavam um processo de transformação lento, porém definidor.

The life pursuit começa com poucas novidades aparentes. “Act of the Apostle part 1” desfia as tradicionais imagens religiosas de Murdoch por uma melodia embebida no melhor dos Zombies. Soa delicado, bonito e a garota que adormece ao sentir o peso do sol sobre a nuca sonha em se tornar uma canção (“Oh, if I could make sense of it all! / I wish that I could sing /I’d stay in a melody / I would float along in my everlasting song / What would I do to believe??”). Soa exatamente como Belle & Sebastian, mas algo parece dizer que a canção será apenas um guia conhecido em uma jornada por lugares nunca antes visitados. O andamento aperta em “Another sunny day”, lembrando as melhores faixas do brilhante If you’re feeling sinister. Apesar de ainda estarmos em território conhecido, a canção é tomada por uma energia que contradiz a fina porcelana dos acordes, e torna a faixa ainda mais interessante. E se a vista ainda parece familiar demais para ser propriamente excitante, Murdoch, o contador de estórias, as sustenta com algumas de suas melhores linhas. “The lovin is a mess what happened to all of the feeling? / I thought it was for real; babies, rings and fools kneeling / And words of pledging trust and lifetimes stretching forever / So what went wrong? It was a lie, it crumbled apart /Ghost figures of past, present, future haunting the heart”, canta ele, sobre o amor que chega ao fim. As primeiras canções de The life pursuit parecem, também, cantar sobre uma banda que chega ao fim. Mas com o fim do amor desgastado, nasce outro mais atual e excitante.

“White collar boy” soa quase como uma outra banda. A bateria, mixada surpreendentemente alta para um disco do B&S, guia a linha de baixo marcante e os vocais de pergunta e resposta, como um onisciente coro grego que tenta convencer o protagonista a tomar o caminho inverso (“You were chained to a girl that would kill you with a look / It’s a nice way to die she’s so easy on the eye”). A melodia lembra Beach Boys e (vá-lá!) Supertramp, e as possibilidades de mudança indicadas pelo disco anterior tomam dimensões dificilmente imaginadas. Com as quase microfonias do final, somos conduzidos a “The blues are still blue”. Quem diria que aquela frágil banda escocesa construiria uma de suas melhores canções em cima de um riff clássico de guitarra? Murdoch brinca com as palavras e as cores, e troca os signos religiosos por roupas em uma lavanderia. Backing vocals galhofeiros e solos de guitarra adicionam à sobriedade da banda um toque inestimável de inconseqüência, e o Belle & Sebastian – aquele senhor aprisionado em corpo de jovem – se encanta, um pouco tardiamente, com as belezas da juventude.

The life pursuit é dominado por canções extrovertidas como as do parágrafo anterior. “Sukie in the graveyard” e “Song for sunshine” buscam teclados em Stevie Wonder, com resultados inesperadamente funkeados. “We are the sleepyheads” com seu abre e fecha de cimbal, e “Funny little frog” misturam soul e disco em divertida equação. “For the price of a cup of tea” é uma das melhores canções já escritas pela banda, e o humor discreto de Murdoch convida o ouvinte para dançar escondendo o ridículo atrás das pálpebras cerradas. “Act of the Apostle part 2” dá um passeio em um teatro vaudeville antes de retomar a primeira parte, dando mais um sujeito à cidade onde Deus adormeceu. O guia conhecido retorna para perguntar como tem sido o passeio, e assumimos a voz da personagem, cantando junto a vontade de se tornar canção.

O curioso é que, como o alívio cômico em um filme de horror, as canções de sorriso largo só fazem destacar os momentos em que o Belle & Sebastian retorna à charmosa timidez dos primeiros discos. “Mornington crescent” e “Dress up in you”, respirações necessárias para quando já perdemos o fôlego na pista de dança, soam, se não mais belas do que o Belle & Sebastian que nos conquistou no passado, mais completas por assumirem, no disco, papéis que colaboram com a fruição do todo. Nesse sentido, The life pursuit é sequenciado como nenhum disco anterior da banda, pois traz uma diversidade inédita que, inevitavelmente, cria uma obra mais versátil. Embora essa idéia não seja regra, os escoceses do B&S a usam com inteligência, e criam o disco mais consistente de suas carreiras.

Surpreendente que, em ano em que bandas razoavelmente semelhantes lançaram discos tão bons, o pai de todas elas ainda se coloque acima da prole. The life pursuit não é tão melancólico quanto o belo álbum do Camera Obscura, ou tão desafiador quanto The crane wife, dos Decemberists. Tampouco tão divertido quanto o surpreendente álbum de estréia dos (25) suecos do I’m from Barcelona. Mas é um disco que incorpora um pouco de cada um desses valores, e monta uma peça por fim mais complexa. Na arte dos discos, nas letras das canções, no design de toda a parte gráfica (ainda sonho em comprar todo o merchandise da banda, até mesmo os itens feitos para garotas), nos arranjos, nas fotos; o Belle & Sebastian sempre me parece um pouco mais do que uma banda. É uma atmosfera, um olhar, uma vontade diante do mundo. E ver essa vontade (de) se travestir de personagens diferentes, sem nunca deixar de ser ela mesma, confirma The life pursuit como um grande disco.

quinta-feira, março 01, 2007

Melhores de 2006 - Discos



05 - Bruce Springsteen - We shall overcome: the Seeger sessions

Bruce Springsteen foi o artista mais importante de 2006. Embora ele não tenha lançado um disco de canções inéditas, e suas turnês americanas não atraiam mais o enorme número de seguidores do passado, a influência de Bruce (o único homem que o jornalismo deveria se negar a chamar pelo sobrenome) na música pop nunca foi tão proeminente. Vários dos discos mais interessantes do ano bebiam diretamente nos melhores trabalhos do chefe, fazendo seu nome voltar a circular nas publicações de música independente. Além de tudo isso, Bruce trocou sua E street por uma big band para gravar um disco apaixonante, chamado We shall overcome: the Seeger sessions.

Para nós, brasileiros, a recepção de We shall overcome é inevitavelmente incompleta. Em primeiro lugar por sua inspiração maior, o ícone folk Pete Seeger, não ter no Brasil expressão próxima da que tem nos EUA. Conhecido por aqui mais como o purista que se revoltou ao ouvir Bob Dylan tocando guitarra elétrica pela primeira vez - no famoso episódio do Newport Folk Festival - Seeger é, na verdade, uma figura chave no movimento folk norte-americano. Embora musicalmente conservador, foi ele um dos pivôs do movimento pelos direitos civis nas décadas de 50 e 60, além de ter escrito canções de enorme sucesso (“Turn, turn, turn” gravada pelos Byrds, e “If I had a hammer”, de Peter, Paul & Mary, por exemplo), restaurado clássicos esquecidos do cancioneiro popular americano, e até mesmo escrito um famoso método para banjo de cinco cordas. We shall overcome não é exatamente uma homenagem a Pete Seeger, o compositor (apenas uma das 13 canções do disco é de co-autoria de Seeger), mas sim ao impacto do músico na cultura norte-americana. Impacto forte o suficiente para fazer Bruce gravar o primeiro disco de covers em seus mais de 30 anos de carreira.

A cegueira à importância de Pete Seeger não é, porém, o que faz de We shall overcome um álbum diferente aos nossos ouvidos. O que é intransferível é a carga cultural impressa no álbum: são canções tão populares nos Estados Unidos que se confundem com a própria identidade do país. Projetar o impacto de We shall overcome nos ouvintes norte-americanos é como imaginar que Bruce Springsteen tivesse gravado um disco de canções de roda, ou algo que o valha. We shall overcome acaba sendo, para nós, um olhar mais profundo no afeto do outro, em um lado da América que raramente nos é mostrado. O mais novo álbum de Bruce se torna ainda mais interessante justamente nesse salto de significado, e na maneira que o artista lidou com esse ruído inevitável. Ao contrário da maioria dos discos de Bruce Springsteen - de produção quase sempre dispendiosa - We shall overcome foi gravado ao vivo no estúdio, em três dias. Talvez por isso o disco se aproxime tanto de outro importante registro folk do ano: a extraordinária trilha-sonora de “A última noite”, filme derradeiro de Robert Altman (já comentado por aqui). A abordagem de valorizar o encontro (a banda tocando ao vivo) é a mesma, com a diferença de que o disco gravado pela Prairie Home Companion tem a atmosfera radiofônica essencial ao funcionamento do show (e do filme). Aqui, a mixagem discreta faz com que uma big band afiadíssima soe intimista, e a voz de Bruce aparece limpa, como se cantada pessoalmente ao lado do ouvinte. Somos jogados, portanto, no meio da festa.

Se a trilha do filme de Altman já traz a fase embranquecida da música folk norte-americana (com muito bom gosto, é preciso ressaltar), Bruce e sua banda parecem ir mais atrás, buscando compreender como seriam as tradições antes de terem se tornado tradições (como fez a fantástica trilha de “E aí meu irmão cadê você?”, anos atrás). A maior parte de We shall overcome é de uma exuberância ímpar. O refrão de “O Mary don’t you weep” é de rara devoção, com um coro que convida o ouvinte a embarcar, de vez, no disco. “Old Dan Tucker” traz Bruce em humor mais leve do que em qualquer outro momento de sua carreira. “John Henry” e a vaudevilliana “Jacob’s ladder” têm mais vida do que qualquer festa que você já possa ter ido. “Jesse James” e “My Oklahoma home” soam tão atuais que poderiam se tornar melhores amigas do Being there, do Wilco. A balada “Shenandoah” é moldada tão perfeitamente pelo timbre de Bruce Springsteen que estaria em casa em seus melhores discos mais recentes, como Devils and dust e The rising. “We shall overcome”, música que se tornou tema do movimento pelos direitos civis nos EUA (equivalente americano para “Pra não dizer que não falei de rosas”, hino de Geraldo Vandré nos dias da ditadura), ganha no disco uma leveza que a carga histórica parecia ter negado à canção até hoje.

O interesse por um disco tão rico quanto We shall overcome vem das mais diferentes fontes. O bom gosto dos arranjos, a elegância da produção, a alma que transparece no encontro. O significado de canções tão embrenhadas culturalmente que os 13 músicos do disco (incluindo o homem de frente) gravaram, de forma tão esplêndida, sem precisar de um ensaio sequer. A voz de Bruce Springsteen que nega sua essência messiânica por uma humildade perante a História. A possibilidade de travar contato direto com a riqueza de uma cultura que tomamos por íntima, mas que consumimos com autenticidade equivalente à do hot Filadélfia na culinária japonesa. E, intelectualizações a parte, pela diversão. Raramente somos presenteados com momentos tão vivos e excitantes quanto os registrados nessas Seeger sessions. Nós, que aqui travamos contato com boa parte das canções pela primeira vez, ganhamos um empurrão extra. Mas, mesmo sem ele, presenciar um artista com uma trajetória como a de Bruce injetando vitalidade em canções que conhece desde garoto (e se divertindo imensamente com tudo isso) é inspiração contundente demais para ser ignorada.