terça-feira, março 18, 2008

Coinbag Philosophy

Com a recente greve da minha placa de som, sou obrigado a interromper a publicação dos textos sobre os discos mais legais de 2007 até descobrir exatamente o que está acontencendo (o que significa que essa lista deve se prolongar até 2010). Aproveito a chance para ser espirituoso e registrar mais uma dessas conjuções de astros que eu sempre penso em publicar por aqui, mas desisto por razões mais nobres e inteligentes do que as que me movem no sentido contrário desta vez.

Saindo embasbacado da revisão de I'm Not There (mais do que se tornar ainda melhor, o filme se mostra um bicho completamente diferente da segunda vez), de braços dados com aquele diálogo de um dos Dylans falando pra sua esposa que mulheres nunca saberiam escrever poesia, chego em casa e dou de cara com essa nota de rodapé em um texto de Jean-Jacques Rosseau:

As mulheres, em geral, não gostam de nenhuma arte, não entendem bem nenhuma e não têm nenhum gênio. Elas podem ser bem-sucedidas nos pequenos trabalhos que só exigem leveza de espírito, gosto, graça e, às vezes, até certa filosofia e raciocínio. Elas podem aprender certa ciência, certa erudição, adquirir certos talentos e tudo o que se conquista através do trabalho. Mas este fogo celestial que aquece e abrasa a alma, este gênio que consome e devora, esta ardente eloquência, estes arroubos sublimes que levam sua fuga até o fundo dos corações sempre faltarão aos escritos das mulheres: eles são todos frios e bonitos como elas; terão todo o espírito que quiserem, mas nunca terão alma; seriam cem vezes mais sensatos do que apaixonados. Elas não sabem nem descrever, nem sentir o próprio amor. Só Safo, que eu saiba, e uma outra mulher merecem ser excetuadas. Eu apostaria tudo em que as Cartas Portuguesas foram escritas por um homem. Ora, em toda parte onde as mulheres dominam, seu gosto deve dominar também: e eis o que determina o de nosso século.

Resumindo: obrigado Rosseau por fornecer base filosófica para que eu possa continuar sendo misógino, irracional e contraditório em paz! Sempre soube que Feist, Susan Sontag e Sofia Coppola (e Claire Denis, e Naomi Kawase, e Joni Mitchell, e Norah Jones, mas voltemos à eloquência!) eram mesmo só as exceções que confirmam a regra.

5 comentários:

Anônimo disse...

Sinceramente, fico muito decepcionado de ouvir uma coisa dessas de um Garoto Gilmore.

Fábio Andrade disse...

mas não vê que isso só explica as coisas?

eu sou quase mulher. tipo a lacráia.

Anônimo disse...

Rousseau é o mesmo do contrato social? ah tá, um beócio contratualista deve entender tudo de mulher; fora o espírito naturalista que fica se remoendo durante a obra. u-hum.

Uma hipótese razoável: filósofo não pega ninguém, logo, mulher não presta.
Um exemplo notório é Nietzsche com seu lábio leporino.

Fábio, dessa vez a bobagem foi forte. Pode até ficar com saudade de movimento no comentador, mas sem exageros, rapaz.

Fábio Andrade disse...

a resposta esperada seria: mallu, você só diz isso porque é mulher. mas isso me faria me parecer muito maluco, porque é tipo responder ao phil anselmo diretamente quando ele comentava aqui no blog.

a resposta menos séria é: que é bobagem até certo ponto não está nem em pauta. na verdade, acho que existe um grande humor em ver um filósofo tentando se embasar/legitimar pra falar mal de mulher. achei que a ironia a esse respeito tinha ficado clara com meus parênteses (enumeração de várias artistas que eu admiro, e que paro de listar pra não destruir a hipótese), mas parece que não. da próxima vez vou lembrar de colocar /irony mode ON antes do texto.

o rousseau é bem menos bobo do que as reduções fazem parecer. é definitivamente um sujeito reacionário, mas em alguns momentos é de uma lucidez muito impressionante. tá muito longe de ser beócio, embora defenda lá suas coisas indefensáveis.

esse texto é um bom exemplo, porque ele passa maior parte do tempo falando mal de teatro e de mulher. na superfície é absurdo, mas as motivações e algumas conclusões são muito, muito interessantes. se você consegue sair das proposições (dizer que a arte é inviável e inútil e que não merece espaço na sociedade, por exemplo) e pensar de fato na filosofia que motiva os textos (ou da qual eles são sintomas), tem coisas muito interessantes.

acho que pensar a citação no nível mais raso só serve como humor de boteco mesmo, mas isso não significa que ela não parte de questões interessantes (e que aí podem ser pensadas socialmente, biologicamente, culturalmente - sempre no ramo das hipóteses, mas não por isso menos interessante).

pensar a coisa toda como evidência de machismo é como pensar "não é aquele cara do bom selvagem?". as questões são bem outras.

mas gosto da hipótese de que filósofo não pega ninguém. acho que é um caminho de onde podem sair várias explicações.

Fábio Andrade disse...

e sobre os comentários: de fato, sentia falta de ver o espaço sendo utilizado. saudade do útero materno (ou, o que explica mais coisa, inveja do pênis mesmo).