terça-feira, fevereiro 17, 2009

Um parágrafo: O Casamento de Rachel (Rachel Getting Married)
De Jonathan Demme, 2008

É interessante que o título original de Rachel Getting Married fosse Dancing With Shiva, pois a música é, sem dúvida, o aspecto estético e político central nesse novo filme de Jonathan Demme. Como questão estética, por Demme trabalhar com essa câmera free jazz, com uma mise-en-scene que precisa ser redefinida o tempo todo, buscando os enquadramentos enquanto as situações se desenvolvem, mas antes que elas se percam completamente (resquício direto da incursão documental mais presente em sua carreira recente). Se, por um lado, essa opção estimula presenças cênicas bastante fortes (sendo a síntese aquele poodle gigante e deselegante que, ao contrário de seus donos, sempre interage com leveza com todos ao seu redor), por outro, revela a maior fraqueza do filme: a necessidade de se instaurar um elemento (Shiva, ou seja, Kym – personagem de Anne Hathaway) capaz de gerar constantes crises, fazendo do roteiro uma rubrica a um cinema que só existe se existir conflito – algo mais questionável pela banalização da idéia de conflito no roteiro de Jenny Lumet, e pela necessidade de se fechar um arco dramático, ao fim. A resposta eloquente, porém, vem da família do noivo – negros, amorosos e extremamente musicais (e dizer que isso não importa é, na verdade, fugir de uma questão que o filme propõe com muita clareza). Não faltam grandes exemplos – da presença segura e silenciosa de Sidney (Tunde Adebimpe, vocalista do TV On The Radio) ao primo militar que voltara temporariamente do Iraque com um sorriso irremovível em seu rosto – e o contraste entre essas estruturas familiares não é exatamente maniqueísta ou ingênuo, mas sim uma postura política. É interessante, portanto, que Jonathan Demme sublinhe essa musicalidade e, ao mesmo tempo, tente incorporá-la ao filme. Ao fim e ao cabo, O Casamento de Rachel é um filme sobre brancos aprendendo a dançar – seja literalmente (a ótima cena com a bateria de samba; a outra, com a máquina de lavar louças; a linda dança a quatro que ilustra esse parágrafo; o Neil Young no casamento), ou pela aceitação da imprevista irmã de cinza, e da chuva na hora do casamento; mas também pelo choro do bebê que perturba a cena, e que Jonathan Demme valoriza como uma interferência bem vinda e musical em seu próprio cinema.

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