terça-feira, fevereiro 13, 2007

Melhores de 2006 - Discos



09 – The Killers – Sam's town

Na América do Norte, o Killers é mais um daqueles casos em que uma banda deixa de ser levada a sério pela crítica mais segmentada pelo excesso de execução pública. Com seu álbum de estréia, Hot Fuss (e, mais especificamente, o hit "Mr. Brightside"), a banda se tornou enormemente popular nos EUA, mas sua música não é distante o suficiente dos mais novos ícones indie para ser abraçada como pop de qualidade pela Pitchfork (caso de Justin Timberlake e Lily Allen, por exemplo). Ao sul do continente, porém, os ecos de tais implicâncias não provocam mais que leves cócegas (motivo pelo qual acredito que Chorão e seu Charlie Brown Jr. ainda serão descobertos como gênios do pop rock em algum canto distante do nosso), e o sempre confiável atraso brasileiro em assimilar as mais novas pragas da indústria (para o bem e o para o mal) nos mantém indiferentes o bastante para receber Sam’s town com moderadas expectativas.

À primeira audição, o segundo disco do Killers parece um quarto extremamente bagunçado de um jovem rapaz que nutre uma secreta paixão por plumas. Apesar da reaparição dos sintetizadores à Duran Duran que garantiram o sucesso do primeiro disco, a idéia de combinar rock clássico com atmosfera de cabaré pé-sujo do segundo parece longe de funcionar. Logo na primeira faixa o disco já faz lembrar o hediondo Kaiser Chiefs, e nenhuma das outras 11 é pronta candidata ao posto de nova "Mr.Brightside" (como no parágrafo anterior, também para o bem e para o mal). O que mais surpreende, porém, é que depois de algumas audições toda essa bagunça começa a fazer um sentido danado, e Sam’s town se revela um disco até mais consistente do que Hot Fuss.

Mais consistente porque em vez de Duran Duran e rock pós-Strokes, temos uma combinação desorientadora de Queen, U2, Bruce Springsteen, David Bowie e Meat Loaf. Sim, o Killers decidiu resgatar o esquecido rock de arena, e nada mais justo que tal resgate seja protagonizado por uma das poucas bandas que enchem arenas na atualidade. Seja pelo quase conceito criado nas simpáticas "Enterlude" e "Exitude", ou pelos coros que tentam levar os refrões aos pés de Vosso Senhor, o Killers quer criar canções maiores do que a vida. E embora a tentativa não seja exatamente bem sucedida, a ingenuidade com que eles se jogam em tal jornada tem momentos de particular beleza. Tanto nas canções mais próximas à essência de Hot Fuss - como "Read my mind" (nova encarnação da melancólica "Smile like you mean it") ou "When you were young" (que regurgita os riffs quase-The Edge que faziam de "All the things that I’ve done" uma canção memorável) - ou em momentos de maior frescor, - a inusitada construção melódica de "For reasons unknown", ou os metais galhofeiros de "Bones" - o Killers transita por territórios extremamente duvidosos com inabalável vitalidade.

Esse excesso de confiança - escancarado no vibratto do desinibido, e apropriadamente batizado, Brandon Flowers - é tão constrangedor quanto comovente, pois Sam’s town não deixa de ser uma seqüência de reapropriações musicais. Se a guitarra de The Edge e os sintetizadores mofados têm influência constante, a atmosfera teatral de Queen e Meat Loaf sustenta canções como "Blig (confessions of a King)" e "Why do I keep counting?", a dramaticidade viril de Bruce Springsteen entoa "My list" e "This river is wild", e o Killers parece reinterpretar todos esses elementos por realmente acreditar em sua força dramática. E isso não é menos que coerente, pois o rock de arena é o espaço onde quem é atração principal não é a banda ou suas canções, mas o espetáculo em si. Em seu segundo disco, o Killers parece incorporar valores tão broadwayanos - ou carnavalescos - e com tamanha consciência, que acaba indo muito mais longe do que qualquer outro filho do mundo pós-Strokes (que, ao contrário do Killers, nunca passou no teste do segundo disco). E quando a derivação é feita às claras, ela deixa de ser entrave e se torna conceito.

Mais do que pela derivação em si, o Killers acerta por buscar boas fontes. Com isso, muitas das intenções aos arredores de Sam’s town acabam sendo, por fim, bem sucedidas. E se todo o glamour decadente que perpassa as 12 faixas do álbum não é propriamente inédito, a releitura feita pela banda é extremamente convidativa. Enquanto Hot Fuss acertava em alguns de seus tiros aleatórios, Sam’s town sabe onde está atirando, e por isso é um disco muito mais coeso. O quarto bagunçado com plumas sob a cama, que estranhamos na primeira faixa, é o mesmo, do início ao fim. A diferença é que em algum momento você embarca na fanfarronice, e ao fim do dia não consegue mais se lembrar qual era mesmo o problema que via nas tais plumas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Maravilha de resenha. E você esqueceu de comentar que tem uma música com uns backing vocals igualzinho o Village People!

Anônimo disse...

resenha redonda, muito boa